terça-feira, 17 de novembro de 2009

CARAMUJANDO

É ótimo ir a muitos lugares, conhecer gente nova, países, cidades, mundos e luas diferentes, mas, como descobriu a pequena Dorothy do Mágico de Oz depois de andar pacas, realmente não há lugar como o nosso lar. Hoje eu estou doente, contrariada com o meu próprio corpo e ficar trabalhando e zanzando na rua, coisa que normalmente é comigo mesma, de repente se tornou doloroso. Tudo o que eu queria na vida era correr pra casa. E corri. Dane-se. Ah, que alívio. A casa é pura proteção para a alma, é o único lugar no mundo onde eu tenho a sensação de estar completamente a salvo. Claro que é só uma sensação, mas é tão boa! Não é que eu seja apegada materialmente à minha casa, é mais uma associação emotiva com a energia do espaço. Deve mesmo fazer parte de uma instintiva proteção contra a vulnerabilidade típica do ser humano buscar esse conforto porque entrar em casa, mesmo que ela esteja completamente vazia, é como se sentir abraçado forte e ouvir "calma, tudo vai ficar bem agora...". É porque, às vezes, tudo o que se precisa de verdade na vida é tirar o salto alto e colocar as Havaianas, é ter a felicidade prosaica de (para quem tiver porque eu não tenho) ver seu cachorro abanando loucamente o rabo de alegria pelo simples fato de você existir, ou ter o direito de esquentar a comida de anteontem e comer na panela vendo televisão agradando seu estômago vazio. A casa é essa cúpula protetora antimísseis da vida lá de fora e ela pode ser uma mansão, um barraco ou até um veleiro, porque no fundo está onde a pomos. Acho que feliz é o caramujo que leva sua casa nas costas e pode se fechar por lá sempre que quiser...

sábado, 14 de novembro de 2009

INFLAÇÃO NAS RELAÇÕES

Ontem assisti a um documentário sobre a busca incessante das pessoas pelo companheiro perfeito e pelas relações afetivas ideais. O resultado de toda uma série de pesquisas e estudos não poderia ser outro que não fosse o massacre de frustração e solidão que elevados níveis de expectativa geram nas pessoas hoje em dia. O programa abordava em especial as mulheres, claro, que, desde criança, são doutrinadas a procurarem pelo príncipe encantado. Neste aspecto é importante notar que o check list a ser cumprido para a obtenção do título de “Príncipe Encantado” sofreu severa inflação. Além de lindo, educado, gentil e fiel, hoje em dia precisa ser financeiramente estável, ter uma carreira promissora, falar línguas e pelo menos pretender um mestrado, não ser emocionalmente dependente, não ser muquirana, ser o melhor amante do universo e adorar crianças e cachorros. Ah, claro, ele ainda tem que se lembrar de todos os aniversários (dias, meses e anos) do primeiro beijo, mandar flores, fazer declarações públicas de amor, dispensar os amigos por você, não ligar muito pra futebol (!?), sorrir mesmo quando estiver com dor de barriga, passear quatro horas seguidas no shopping sem reclamar e defender a amada dos ataques subliminares da mãe dele. Que cansaço! É muito, muito difícil atender a tantos critérios de classificação. As revistas femininas estão cheias de “dicas” para testar o incauto candidato. Se o cara virar a cabeça duas vezes para a esquerda durante o jantar já é um sinal de que a coisa não vai bem. Se o cara atender ao celular enquanto você foi ao banheiro é sinal que não está tão a fim assim de você. Se ele não te ligar até o meio-dia do dia seguinte ao primeiro encontro é porque é um canalha e não vai mais querer saber de você. Pronto. E essa maluquice já justifica uma overdose de sorvete de doce de leite da Häagen-Dazs cumulada com uma tripla sessão de comédias românticas alugadas com lágrimas nos olhos na locadora! O que se revela uma péssima ideia, já que o último filme acaba com um homem correndo atrás da mulher amada feito louco em um aeroporto gritando “Please, don´t go! I love you!”. Acho que não deve ser à toa que os filmes, inclusive comédias românticas, vêm com um prudente alerta de que se trata de uma obra de ficção e que qualquer semelhança com fatos reais é mera coincidência... Não estou aqui dizendo que o amor não existe, que encontros casuais não podem virar grandes romances, não é isso. Eu sou prova viva que um grande amor pode existir e aparecer até para quem nunca acreditou muito nele. Sim, eu ouvi os sinos tocarem quando me descobri apaixonada pelo meu marido. E tocaram alto, desesperadoramente alto (isso somente porque eu me permiti ouvi-los tocar). Também não estou dizendo que é preciso se contentar com “qualquer um”, com estar ao lado de alguém com desvio de caráter e que não acrescente nada ou que faça mais mal do que bem. Sou contra emburrecimento amoroso. Mas fico sempre pensando que a maioria dos relacionamentos que eu vi ir para o buraco não acabou por falta de amor, mas por falta de tolerância e por falta, principalmente, de se evitar a projeção no outro daquilo que se idealiza de alguém como condição para estar ao seu lado. Será que não basta uma pessoa gostar muito de você, sofrer quando você sofre, cuidar de você quando está doente de vomitar (pra mim não existe maior prova de amor), pensar em você da hora que acorda até a hora de ir dormir, rir junto, dividir umas esfihas porque a grana está curta? Não? Ela ainda precisa acordar de bom humor, amar literatura e filmes europeus necessariamente? A pessoa tem mesmo que ser perfeita? Mas perfeita como? Como ninguém! Todo mundo têm suas manias e idiossincrasias. Então, por que não tentar conversar, contornar e aceitar pequenas incapacidades alheias? Por que se tornar intolerante por o outro não te dar rigorosamente aquilo que ele simplesmente não tem condições de te dar? E por que não tentar enxergar só um pouco, só de vez em quando, quanta coisa maravilhosa ele pode te dar? Marguerite Yourcenar (uma escritora que eu aprendi recentemente a amar), dando voz a um sábio imperador romano que avaliava com prudência as relações sociais, escreveu “nosso grande erro é tentar encontrar em cada um, em particular, as virtudes que ele não tem, negligenciando o cultivo daquelas que ele possui”. E quanto isso acontece, não é mesmo? Não só com os pares, mas com nossos pais, irmãos, com nossos amigos, chefes, colegas. É tão mais fácil enxergar só o ruim ao invés de colocar no pratinho de lá da balança o que vemos de bom no outro. Provavelmente seríamos surpreendidos com a relação custo x benefício! Ah, não, mas somos “tão” independentes, “tão” senhores da razão, sabedores do bem do mal, do melhor e do pior que não podemos ser incomodados com esse tipo de exercício de julgamento mais cauteloso. Dá tanto trabalho... Para nos sentirmos confortáveis dividindo nossa bolha com o outro é preciso que as pessoas cumpram um protocolo, que tenham um comportamento predeterminado, tal qual fora idealizado. Não cumpriu? Adeus! Mas não é assim. Cada um tem em si nobrezas e hostilidades, dias bons e dias não tão bons, maneiras diferentes de ver as coisas, valores distintos e não por isso deve ser menos digno do voto de confiança de fazer parte da nossa vida. Mas, como tudo pode ser mais fácil do que o bom senso... quem quiser que siga por aí testando beijar todos os sapos do mundo. Eca!

EPITÁFIO

E porque da vida a potência da morte é parte inseparável, um dia, quando eu morrer, porque todo mundo morre um dia, pedirei humildemente emprestadas as palavras que Marguerite Yourcenar deu ao Imperador Adriano:
"Pequena alma, alma terna e inconstante, companheira do meu corpo, de que foste hóspede, vais descer àqueles lugares pálidos, duros e nus, onde deverás renunciar aos jogos de outrora. Por um momento ainda contemplemos juntos os lugares familiares, os objetos que certamente nunca mais veremos... Esforcemo-nos por entrar na morte com os olhos abertos..."

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

UM DOS PORQUÊS DE AMAR LIVROS INFANTIS

MANIA DE EXPLICAÇÃO
"Era uma menina que gostava de inventar uma explicação para cada coisa.
Explicação é uma frase que se acha mais importante do que a palavra.
As pessoas até se irritavam, irritação é um alarme de carro que dispara bem no meio de seu peito, com aquela menina explicando o tempo todo o que a população inteira já sabia. Quando ela se dava conta, todo mundo tinha ido embora. Então ela ficava lá, explicando, sozinha.
Solidão é uma ilha com saudade de barco.
Saudade é quando o momento tenta fugir da lembrança pra acontecer de novo e não consegue.
Lembrança é quando, mesmo sem autorização, seu pensamento reapresenta um capítulo.
Autorização é quando a coisa é tão importante que só dizer "eu deixo" é pouco.
Pouco é menos da metade.
Muito é quando os dedos da mão não são suficientes.
Desespero são dez milhões de fogareiros acesos dentro de sua cabeça.
Angústia é um nó muito apertado bem no meio do sossego.
Agonia é quando o maestro de você se perde completamente.
Preocupação é uma cola que não deixa o que não aconteceu ainda sair de seu pensamento.
Indecisão é quando você sabe muito bem o que quer mas acha que devia querer outra coisa.
Certeza é quando a ideia cansa de procurar e pára.
Intuição é quando seu coração dá um pulinho no futuro e volta rápido.
Pressentimento é quando passa em você o trailer de um filme que pode ser que nem exista.
Renúncia é um não que não queria ser ele.
Sucesso é quando você faz o que sempre fez só que todo mundo percebe.
Vaidade é um espelho onisciente, onipotente e onipresente.
Vergonha é um pano preto que você quer pra se cobrir naquela hora.
Orgulho é uma guarita entre você e o da frente.
Ansiedade é quando faltam cinco minutos sempre para o que quer que seja.
Indiferença é quando os minutos não se interessam por nada especialmente.
Interesse é um ponto de exclamação ou de interrogação no final do sentimento.
Sentimento é a língua que o coração usa quando precisa mandar algum recado.
Raiva é quando o cachorro que mora em você mostra os dentes.
Tristeza é uma mão gigante que aperta seu coração.
Alegria é um bloco de Carnaval que não liga se não é fevereiro.
Felicidade é um agora que não tem pressa nenhuma.
Amizade é quando você não faz questão de você e se empresta pros outros.
Decepção é quando você risca em algo ou em alguém um xis preto ou vermelho.
Desilusão é quando anoitece em você contra a vontade do dia.
Culpa é quando você cisma que podia ter feito diferente, mas, geralmente, não podia.
Perdão é quando o Natal acontece em maio, por exemplo.
Desculpa é uma frase que pretende ser um beijo.
Excitação é quando os beijos estão desatinados pra sair de sua boca depressa.
Desatino é um desataque de prudência.
Prudência é um buraco de fechadura na porta do tempo.
Lucidez é um acesso de loucura ao contrário.
Razão é quando o cuidado aproveita que a emoção está dormindo e assume o mandato.
Emoção é um tango que ainda não foi feito.
Ainda é quando a vontade está no meio do caminho.
Vontade é um desejo que cisma que você é a casa dele.
Desejo é uma boca com sede.
Paixão é quando apesar da placa "perigo" o desejo vai e entra.
Amor é um gostar que não diminui de um aniversário para outro. Não. Amor é um exagero... Também não. É um desaforo... Uma batelada? Um enxame, um dilúvio, um mundaréu, uma insanidade, um destempero, um despropósito, um descontrole, uma necessidade, um desapego?
Talvez porque não tivesse sentido, talvez porque não houvesse explicação, esse negócio de amor ela não sabia explicar, a menina." (Adriana Falcão
in Mania de Explicação).

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

TODO MUNDO TEM UM LADO B?

Em geral, eu acho que sou uma pessoa legal. Sou bem humorada, falo umas besteiras, não encho muito o saco de ninguém, fico na minha, deixei de ser nerd e cdf, curto cinema, curto sair, curto ficar em casa também, topo programa de índio (desde que não envolva escalar montanha com chuva), não sou muito chata pra comer, converso com as pessoas na fila do banco, sou amiga do PréII do cara do balcão da padaria, atendo super bem um ex-colega do colégio que me achou no MSN (que eu não vejo há uns 18 anos e que insiste loucamente em falar sobre como eu era quando criança), dou risada de piada besta, digo “por favor”, “obrigada” e “desculpe” pra caramba, adoro responder e-mails-terapia gigantescos de amigas e cunhadas, assisto rindo uma peça de teatro amadora de uma amiga às 10h da manhã de um sábado, tenho vergonha alheia, amo animais, curto festa junina, ligo para os amigos só para saber como eles estão, ajudo velhinhas a atravessarem a rua, brinco com criança feito criança, acompanho com prazer (mesmo!) as compras da minha sogra na Rua 25 de Março e ouço numa boa ela falar sutilmente sobre como a minha vida profissional poderia ser melhor, trato bem a moça do telemarketing da empresa de filtros de água que me ligou a segunda vez no mesmo dia... Enfim, sabe pessoa fofa? Então, o EU que eu conheço e que eu gosto de ser é assim.

Mas, às vezes, eu viro um monstro. Não sei se é excesso de hormônios, um instinto psicótico meio adormecido que desperta com a mudança da lua, não sei! O fato é que em certos dias (e não necessariamente em semana TPM – terror para maridos) eu estou simplesmente insuportável. Acontece isso com os outros de virarem uma pessoa horrível de vez em quando ou é só comigo? Eu queria muito saber...

Porque nesses dias eu não durmo direito, acordo irritada, fico muda com o marido e não faço nem a pau o leite com Nescau dele de manhã, não controlo minha língua, pratico uns dois sincerocídios por dia, brigo no trânsito de mostrar o dedo do meio (ai...), me meto na vida dos outros, digo “vai logo”, fico louca da vida com umas bobagens, fico falando “tá, tá bom, tá bom” ao telefone, brigo com o meu pai (que é a pessoa mais impossível de brigar no universo), reparo na roupa das pessoas, pergunto para o meu marido 4 vezes em uma hora se tem alguma mulher dando em cima dele no trabalho (não, não uso a palavra mulher, uso um termo bem mais chulo) e faço mais um monte de outras idiotices sem tamanho!

Só que, claro, quanto mais irritada e chata eu fico, mais as coisas começam a dar completamente errado: o elevador não vem e faltam 5 minutos para uma audiência, eu subo correndo e bufando os nove andares de escada usando salto 8 e a pauta está atrasada “só” 2 horas; minha pasta abre no meio da rua e espalha papel por todo lado; a bateria do celular acaba; sou atacada por uma nuvem de pernilongos no fórum de Santo Amaro (!); um cara prende meu carro no estacionamento e leva a chave (!!!); o cliente não paga meus honorários atrasados; o sol torra meus miolos; a enxaqueca chega e a faxineira falta!!!

Aí só me resta mesmo dar um grito, tomar um banho gelado chorando e dormir mais cedo rezando para eu voltar ao normal no dia seguinte, o que, ainda bem, geralmente funciona. Só fico pensando que da próxima vez que aparecer esse meu lado negro vou poupar o mundo de mim e ficar na cama assistindo alguma coisa do tipo “Herby, Se Meu Fusca Falasse” na versão original de 1969 na Sessão da Tarde!

Faz parte da vida e de ser mulher, mas graças a Deus que isso só acontece de vez em quando, mas bem de vez em quando mesmo...

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A VIDA É UMA SUCESSÃO DE CUBOS MÁGICOS

Só a sensibilidade de uma "menina" fantástica poderia ter me apresentado a algo assim... La Maison en Petits Cubes, de Kunio Kato, vencedor do Oscar 2009 de Melhor Curta de Animação - http://vimeo.com/3352352.

UM DOS PORQUÊS DE AMAR GUSTAV KLIMT
















The Kiss, Gustav Klimt

terça-feira, 3 de novembro de 2009

AOS MEUS SOBRINHOS SEMPRE...

... filme da Barbie, desenho de monstro, cinema 3D, pipoca gigante, apostar corrida, histórias malucas, dar colo, dormir tarde, bala de goma, escovar os dentes gargalhando, bronca da bagunça, arremesso na piscina, cócegas, comer besteira, overdose de video game, cochilar abraçado e amar profundamente.

O MELHOR ELOGIO

Eu devia ter uns 11 anos quando recebi o melhor elogio da minha vida. Foi de um primo mais velho muito querido. Não, eu não era apaixonada por ele, e não, a gente não brincou de médico nenhuma vez. Ele sempre me tratou como o irmão mais velho que eu nunca tive (bom, nunca tive nem mais novo também) e um dia me disse que eu era a menina mais bonita que ele conhecia porque eu sorria com os olhos. Claro que com aquela idade não se entende muito bem isso, mas achei o máximo ele dizer aquilo de “sorrir com os olhos”. Agora, depois de tantos anos, descobri que existe um monte de gente nesse mundo que faz isso também. E quer saber? É lindo mesmo.